13,82 bilhões de anos atrás, em uma galáxia muito muito distante todo lugar e lugar nenhum a energia de um Universo inteiro estava concentrada em uma singularidade. Uma flutuação quântica desequilibrou esse sistema, gerando algo que na falta de termo melhor, chamamos de explosão, mas é uma expansão de energia que cria o próprio continuum espaço-tempo. Não é uma bomba explodindo dentro de um cômodo, é um balão inflando rápido. Não em 3, mas em alguns modelos, em 11 dimensões.
Essa energia foi se condensando em partículas elementares, que tentavam se agrupar em átomos, mas cada vez que um próton se aproximava de um elétron para formar um átomo de hidrogênio, um fóton saltava para o elétron e impedia. Isso durou até os fótons perderem energia suficiente para não conseguirem mais energizar os elétrons. Formaram-se os primeiros átomos e os primeiros fótons livres. Para quem acha que o momento “que haja luz” foi no Primeiro Dia, lamento, levou 387 mil anos após o Big Bang.
Tem a ver, não reclame.
De lá para cá o Universo continuou se expandindo e esfriando. Sabemos até a velocidade: 67,3 km/s por megaparsec, ou 3,26 milhões de anos-luz. Quanto mais distante o objeto, mais rápido se afasta, conforme descobriu um sujeito chamado Hubble. Só tem um problema. Segundo o modelo gravitacional atual não há matéria suficiente pro Universo se sustentar. Galáxias não existiriam na forma atual só com a matéria visível.
É preciso que exista algo chamado Matéria Escura compondo a maior parte do Universo. Há experimentos que estão prestes a comprovar ou não sua existência, mas outra descoberta complicou mais ainda o modelo: o Universo está… acelerando. A velocidade de expansão está subindo. isso é atribuído a algo chamado Energia Escura.
Assim a constituição do Universo fica:
- 4,9% – matéria normal, eu, você, a Luciana Vendramini e todos os Ladas
- 26,8% – matéria escura
- 68,8% – energia escura
Eu sei que a conta dá 100,5% mas o 0,5% é do deputado que intermediou a negociação.
Plank, telescópio espacial lançado para pesquisar Matéria Escura.
Uma das evidências de comprovam esse modelo é a chamada Radiação de Fundo Cósmico, descoberta por Arno Penzias e Robert Wilson e que rendeu um muito merecido Nobel. Eles utilizaram radiotelescópios ultrasensíveis apontados para pontos vazios do espaço, e descobriram um sinal de microondas, na faixa de 160,2 GHz. Muito, muito, muito fraco. Vindo de todas as direções. Originalmente eram os primeiros fótons do Big Bang, no evento no Ano 387 mil. Com o desvio para o vermelho, causado pelo Efeito Doppler, esses fótons hoje viraram microondas, deixaram há muito de ser luz visível.
O resultado de nove anos de coleta de dados, medindo variações de temperatura na casa de milésimos de grau:
Como você pode perceber, o Universo não é uniforme. Essas variações de densidade e temperatura são previstas, e batem quase perfeitamente com flutuações quânticas em um corpo de tamanho infinitesimal. São equivalentes a desenhos na superfície de um balão, inflado quintilhões de vezes.
Note que eu falei QUASE perfeitamente. Pois é. Aí entra OUTRO problema. Segundo o modelo cosmológico deveríamos captar monopolos magnéticos (partículas exóticas com somente um pólo magnético). A distribuição de matéria no Universo também não funciona, se revertermos a linha do tempo. Ela é homogênea demais.
A solução para isso foi proposta em 1980 por um cidadão chamado Alan Guth e aperfeiçoado depois por Andrei Linde. Eles sugeriram que o Universo logo após sua criação passou por um chamado Período Inflacionário.
Explicando: lembra dos 387 mil anos lá de cima? Esqueça.
O Big Bang ia tranquilo, seguindo sua vida, até que 0,00000000000000000000000000000000001 segundos depois de seu início, o Universo começa a se expandir em velocidade acelerada. Não os ridículos 67,3 km/s por megaparsec de hoje, mas muito, muito mais rápido. E não ligue pra velocidade da Luz, é o continuum espaço-tempo que está se expandindo.
Durante o período inflacionário o Universo cresce 10 trilhões de trilhões de trilhões de trilhões de vezes. Quanto tempo ele leva para crescer isso tudo? 0,00000000000000000000000000000001 segundos.
É isso. Toda a teoria do Universo Inflacionário se resolve em um pentelhonésimo de segundo, período no qual a temperatura do Universo caiu de 1.000.000.000.000.000.000.000.000.000 kelvin para o Inverno de Westeros de só 10.000.000.000.000.000.000.000 kelvin. Ao final do período, a temperatura subiu de novo.
Isso gerou uma perturbação de tal magnitude que ondas gravitacionais deixaram marcas no próprio continuum espaço-tempo. Essas cicatrizes continuaram crescendo junto com o Universo, e em teoria deveriam aparecer na Radiação de Fundo Cósmico.
Nós sabemos inclusive como elas devem se parecer. É a chamada Polarização B-Mode. Ela existe em duas formas: uma causada por lentes gravitacionais, outra causada pelo período inflacionário do Universo. A Polarização por lentes foi detectada ano passado, lentes gravitacionais são um fenômeno legal que permitem que a gente detecte planetas em outras galáxias. Já a Polarização B-Mode tipo 2 até então era desconhecida.
Era. Astrônomos de Harvard, usando um telescópio chamado BICEP2 (Background Imaging of Cosmic Extragalactic Polarization), conseguiram depois de 3 anos estudando dados acumulados, procurando erros e falhas de metodologia, captar variações na radiação de fundo cósmico consistentes com o modelo previsto para Polarização B-Mode tipo 2.
Não foi fácil, lidaram com variações de temperatura de 1/100.000 de kelvin, mas o ar rarefeito não poluído da Antarctica, onde o BICEP2 está instalado, ajudou. Nas palavras de um dos envolvidos, “procurávamos uma agulha em um palheiro. Achamos um pé de cabra”.
É uma prova do Modelo Inflacionário equivalente a jogar uma pedra pro alto, ela cair e você concluir que gravidade existe.
De quebra a descoberta também prova indiretamente a existência de ondas gravitacionais, previstas por Einstein e que até agora não conseguimos identificar.
A única escala que impressiona mais do que o Big Bang é a velocidade com que aprendemos a entender o Universo. 400 anos atrás estávamos queimando gente que ousava dizer que a Terra não era o Centro do Universo e não tinha 6.000 anos. Hoje compreendemos a Criação de 0,00000000000000000000000000000000001 segundos em diante. O Desconhecido, a Superstição está cada vez mais encurralado. Em um piscar de olhos para o Universo passamos de macacos pelados para criaturas capazes de observar o passado distante e ver as cicatrizes do nascimento do Cosmos.
Na improbabilidade de não nos explodirmos nos próximos séculos (ok, semanas) imagino quanto conhecimento teremos acumulado. Provavelmente nossos descendentes acharão graça nas dúvidas e questionamentos de hoje em dia. Em um milhão de anos talvez estejamos criando pequenos universos em laboratório, dobrando o espaço-tempo com tecnologia indistinguível de magia.
Quem viver, verá.
Agora, um momento humano. Chao-Lin Kuo, Professor-assistente em Stanford foi até a casa de Andrei Linde, um dos pais da Teoria do Universo Inflacionário, contar da descoberta. A reação de Linde é emocionante. Você vê um simples homem percebendo que ele compreendeu corretamente um momento fundamental nos primórdios do Universo. É como se alguém tivesse levado Kepler em uma viagem pelo Sistema Solar. Não temos mais o hábito de queimar cientistas (só processar), mas mesmo assim é raro ver teorias fundamentais comprovadas no período de vida de seus autores.
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