É intrigante pensar em que momento saímos da linha e descambamos para uma piada em forma de país. Há quem defenda que sempre foi assim.
Não me interessa seu partido ou a filosofia política que você segue. Se você consegue um nível minimo de abstração capaz de somar dois mais dois, poderá perceber que tem algo errado com o preço das coisas neste país. Os bens de consumo são caros, os impostos são altos, os imóveis chegam a custar somas absurdas. E apesar de tudo isso, ganhamos pouco, (na média comparada a outros países).
Se fosse um problema de falta de dinheiro, tudo ficaria mais fácil de entender. Mas por mais estranho que pareça, vivemos um problema de sobra de dinheiro. Aliás, sobra de um lado, falta do outro. O fato é que o Brasil se tornou gradualmente um paradoxo ao longo dos anos. O país em si é bom. A começar por suas dimensões continentais.
Não tem terremotos destruidores, não tem atentado terrorista, não tem nevascas violentas nem vulcões cataclísmicos. Há uma natureza exuberante, lugares idílicos, o solo é talvez o mais fértil do mundo, as dimensões continentais propiciam uma ampla variedade de microclimas, chove legal, permitindo matrizes elétricas de menor risco e impacto ambiental, há uma oferta monumental de petróleo e minerais diversos, alguns raríssimos, como as terras raras necessárias para produzir ímãs de neodímio. Nossas jazidas, mantidas inexploradas estrategicamente pelo governo só perdem para as da China. Temos um volume monumental de ferro, pedras preciosas, ouro. Madeiras nobres, comida farta, uma extensão incomensurável de praias, montanhas, rios e lagos. E uma coisa que é excepcional mas quase ninguém se dá conta: Todo mundo fala a mesma língua!
E com tudo isso, o que me impressiona é: Como que tendo tudo isso, somos uns bostas?
Sim, porque só uns bostas para aceitar viver num país que é ruim. Tem gente patriota que fica com raiva de mim quando digo que hoje, o Brasil é um lugar ruim. Mas ficar com raiva é fácil. Quero ver refutar com argumentos.
Se fosse bom tinha tanto protesto?
O Brasil está ruim por “N” motivos, a começar por suas políticas, historicamente problemáticas, que não é uma culpa desse ou daquele governo em especial, mas responsabilidade de cada um deles em parte, bem como as coisas que melhoraram, e é inegável que elas ocorreram, devem ser laureadas a cada um deles.
Eu nasci no século vinte, e passei a vida inteira ouvindo que vivia no “gigante adormecido”. Passamos todo o século XX acreditando que fazíamos parte do “país do futuro”.
Agora, o futuro chegou pra nós e caiu a ficha que, mesmo que as coisas tenham melhorado muito quando comparadas ao passado (o que não é vantagem nenhuma, já que o PLANETA todo melhorou comparado ao passado), essas coisas continuam bem ruins. Claro, sempre vai ter aquele joguinho malandro de apontar o mais fodido, para o remediado se sentir por cima. “olha o Paraguai! Olha Uganda!”
Porra, velho, não me leve a mal, mas a vida – até onde a gente tem certeza – é essa aqui.Pode ser que não role segunda chance! Então, por que a gente deve se comparar por quem está atrás? Pense numa corrida, me diga qual piloto está em oitavo lugar e pensa que ao invés de atingir a pole position fica feliz em saber que ainda tem um zé ruela retardatário atrás dele? Nenhum.
Então sempre vai ter um pra dizer: “Mimimi, na Europa os caras estão ferrados, com desemprego e crise…”
Ok. Verdade. A parte trágica de uma economia cada vez mais global é que os países compartilham as fodas juntos. Uns mais que outros, né Grécia?
Mas continua sendo verdade que qualquer desempregado europeu vive melhor que a maioria dos bem empregados brasileiros. A começar pelo seu nível de instrução.
“Ah, mas aí é uma questão histórica!”
Fato. Nossa educação nos mais variados níveis baleiou durante décadas e colhemos hoje o fruto do descaso. Não só desse. De outros também.
Concluir que “deu ruim” é tão fácil que até uma pessoa com QI desprivilegiado como eu consegue.
A grande questão que se coloca diante de qualquer um de nós, brasileiros, é ter que enfrentar um problema difícil de resolver:
Como é que faz para virar um país de classe média, ou de vida confortável para todo mundo, se a gente passou 500 anos construindo cuidadosamente uma estrutura para ser usufruída apenas por 5% da população?
Fato inegável e irrefutável. Vivemos na terra dos reis do camarote. Já era assim desde o tempo de Dom João VI.
Enquanto quem tem muito dinheiro voa de helicóptero, o povo se aglomera como formigas para pegar um trem, um metrô e ainda agradece a Deus quando não leva chicotadas. A falta de infraestrutura atingiu níveis assustadores.
Só para efeito ilustrativo, enquanto em 1993 o metrô de Xangai, a segunda maior cidade da China, simplesmente não existia, ele começou as operações naquele ano, hoje tem 439 km e, em 2012, levou 6,7 milhões de passageiros por dia.
O metrô de Xangai tem 15 linhas e mais 3 planejadas até 2020. Já o metrô do Rio tem míseros 40.9 Km de extensão, transporta (mal) 640 mil passageiros por dia (dados de 2011) e sua expansão é 2 estações, uma em construção e outra planejada. Para ficar mais gritante a diferença, o metrô carioca começou a ser construído em 1970 e a ser operada em 1979. Desde 1993 foram inauguradas 12 estações.
Quem está com 25 anos hoje por aqui, é da primeira geração em que todo mundo frequentou a escola básica. Essa é a primeira geração que nasceu majoritariamente nos grandes centros urbanos. Uma galera que cresceu com as facilidades de comunicação e informação da telefonia celular e da internet.
Essa é a parte boa, o problema é que na média, esse cara que está com 25 anos não teve um bom Ensino Médio, exceto para uma elite de uns 30%, que provavelmente você faz parte, já que está lendo até aqui e entendendo. Esse cara também não frequentou o Ensino Superior, exceto para uma elite peneirada de sortudos que corresponde a 5%.
Claro, talvez ele tenha um smartphone, mas se aperta no ônibus e se tiver carro, dirige pelo acostamento quando tem engarrafamento. Talvez tenha TV por assinatura, mas dificilmente tem coleta e tratamento de esgoto decente. Com 99,9% de certeza não tem separação de lixo doméstico. Provavelmente ele até tem emprego, mas não sabe dizer com total certeza se consegue voltar vivo para casa na periferia.
Este cara é feliz que vai ver uma Copa e uma Olimpíada no Brasil. Só que ele talvez não tenha se ligado que ele paga sua parte das obras, mas não vai poder estar lá pra ver.
Se ele for uma pessoa de sorte de estar no pequeno numero de pessoas que conseguiu comprar seu próprio imóvel, seja por meio de programas assistencialistas ou trabalhando feito um condenado para poder dar a entrada, arrumar milhões de documentos e comprovações necessárias para financiar na Caixa, ele morará num imóvel que representa uma conquista importante. Mas parece uma piada trágica quando comparada com o que ele poderia ter comprado no exterior. Veja e me diga se não dá depressão:
Fotos de um apartamento de 2 quartos à venda na Suécia, em Malmö. Preço: R$ 175.000 reais. (sim, reais!)
Imóvel de R$ 165.000 em São Paulo, Osasco, perto do Rodoanel:
Exemplo extremo? Nada, eu peguei leve. Quer ver um exemplo realmente extremo de comparativo de como perdemos a noção completamente? Aqui está:
Apartamento em Copacabana (no subsolo, sem janelas e com pé direito de -não ria- 1,75m! Preço da brincadeira: R$ 300 MIL REAIS) olha que lindo:
Curti o sofá.
Não repare a bagunça do APARTAMENTO, ok?
Agora, vamos ver o que dá pra comprar com essa mesma grana lá fora. Um singelo apê de 2 dormitórios em Fort Lauderdale, uma das praias mais badaladas dos EUA:
O forno e geladeira de cinema estão incluídos! 
Eu sei. É tão doido que certamente você vai duvidar, então por via das dúvidas, consulte:
http://www.bomnegocio.com/rio_de_janeiro/rio_de_janeiro_e_regiao/av__n__sra_copacabana_1150_posto_6_subsolo_23184115.htm
http://www.trulia.com/property/3045253709-2020-NE-56th-St-105-Fort-Lauderdale-FL-33308#photo-5
Você pode ver outros comparativos (recomendo ter em mãos remédio de depressão) no site Estamos ricos
Pulando a questão da bolha especulativa (que é ÓBVIO QUE EXISTE) e a dormência causada pelos tão esperados grandes eventos mundiais que encheram os bolsos dos empreiteiros, o Brasil ainda é o país do futuro.
O problema é que o futuro nunca chega.
E quando chega, o futuro próximo é um mar de problemas que vem se agravando CLARAMENTE, apesar de não haver ninguém gritando que vai dar merda. Talvez porque a grande merda esteja agendada para depois que passar a euforia dos jogos, que repito, será diversão para um 5% de abastados e reis do camarote, os caras que vivem lá na antena da pirâmide social.
Não me entenda mal, não sou contra os ricos. MUITO PELO CONTRÁRIO! Eu mesmo queria ser um cara rico. E considerando a miséria em que muitas pessoas aqui estão vivendo, talvez eu até já seja em algum grau.
Não gosto de ser portador de más notícias, mas chega a ser estranho a corrida presidencial em busca da cadeira de líder do Executivo quando o cara que sentar lá vai ganhar junto o “cetro do abacaxi”.
A meta da inflação (IPCA), estabelecida em 4,5% já bateu 5,84%
Déficit Publico (jan-set, em bilhões de reais) em 2012 e 2013:
Déficit Externo (jan-set em bilhões de dólares) em 2012 e 2013:
O governo do Brasil, que se fosse sério, estaria preocupado e articulando soluções, optou pela jogadinha clássica: Diz que os números ruins são “só especulação”. Desde sempre, o Brasil tem esta queda por números bonitos, varrendo os feios para debaixo do tapete. As agências internacionais já até planejam rebaixar a nota de crédito do Brasil.
Isso acontecer justo no momento que precisaríamos dar um gás na infraestrutura é terrível. É como estar na proa do Titanic e ver o iceberg chegando enquanto o comandante acelera o curso porque pensa que o navio é “inafundável”!
Para se desenvolver, o nosso Brasil brasileiro, da mulata e pandeiro, precisa melhorar a infraestrutura que já tem e é caquética e investir na construção de uma nova infraestrutura. O desafio é fazer isso com a ajuda da iniciativa privada quando não se dá as condições mínimas para tal. A consultoria Mckinsey calculou em recente estudo que o Brasil precisaria investir 5 trilhões de reais num prazo de 20 anos – só pra tirar a diferença da empurrada com a barriga dos anos anteriores.
Para nossa triste surpresa, o que estamos fazendo? INVESTIMOS MENOS QUE A MÉDIA MUNDIAL. Menos que alguns países muito afetados pelas crises econômicas globais. Isso é o que eu chamo de agenesia da noção. É a irresponsabilidade para com o futuro das crianças em seu nível máximo. Porque quem vai segurar essa banana, são eles.
A China (comparar com a China chega a ser maldade) investiu de 1992 a 2012 nada menos que 8,5% do PIB (e o PIB chinês é um colosso de US$ 8,28 trilhões. Que na sua fase RUIM cresce a 8% ao ano, em 2010 crescia a 10%)
A Índia, um país com inúmeros problemas sociais e desigualdade cabulosa, investe 4,7% do PIB em infraestrutura.
O Brasil, investe ridículos 2,2%.
O resultado dessa bosta de investimento é facilmente detectado por quem mora aqui. Estradas esburacadas, deficiência na entrega de encomendas, custos altíssimos de frete, falta de saneamento que implica em doenças, degradação urbana, as nossas cidades ficaram inviáveis, e etc e tal. Dessa forma, nosso estoque de infraestrutura está abaixo da média mundial, que é de 71%. Pra se ter uma ideia, o Japão, um país apertado numa ilha, tem 179% de estoque de infraestrutura. A gente aparece na rabeira, com 48% de estoque de infraestrutura, atrás da Índia novamente.
Dessa forma, é triste perceber que estamos num país que PRECISA MAIS QUE DOBRAR os investimentos na infraestrutura até 2033 para se equiparar aos demais países do mundo. Todos os investimentos, propagandeados com obras que nos “tirariam do torpor” são conversas fiadas. A maior parte das tão aclamadas obras tratam-se de projetos antigos – alguns com mais de 50 anos – que não encontravam meio de serem viabilizados por um mar de complexidades diversas chamado de “atual conjuntura”.
Somando TUDO que já foi anunciado até agora na área de infraestrutura do país, chegamos a 1,1 trilhão de reais para os próximos 20 anos. No ano passado investimos só 100 bilhões. Precisaríamos no mínimo subir para 240 bilhões ao ano, e acumular 5 trilhões de reais até 2033.
Este é o panorama da infraestrutura, mas a coisa é ainda pior. A educação ainda é fraca e cara no Brasil. Vemos os valores subindo acima da inflação, com aumentos de 15%, enquanto a melhora qualitativa do ensino, que é o que realmente importa, não acompanha. O Brasileiro, que já ganha mal, é tungado num monte de coisas que no exterior lhes oferecem gratuitamente e com mais qualidade. Aliás, perdão, gratyuitamente não, ele PAGA isso no imposto. Só que lá ele vê retorno. Já aqui… Dá revolta, e a sorte dos políticos é que a massa vive numa miséria tão obscena que nem sequer sabem como poderia ser para poder se indignar. A vida do pobre hoje se resume a lamber a mão de quem os alimenta.
A saúde é uma questão nevrálgica para qualquer país e aqui não é diferente. Mas o que o Brasil faz de diferente é tratar o assunto com populismos e conveniências. A coisa é grave em muitos níveis, até no nível da classe média, que se fode toda para pagar planos de saúde privados, o que felizmente desafoga um pouco o SUS, que atende os mais necessitados. Com o tempo os planos de saúde estão cada vez piores. Cada vez investem mais em publicidade e menos em qualidade. Pagam mal aos médicos, que se descadastram, reduzindo assim a capacidade de atendimento a quem paga caro por isso. Quem não tem nenhum dos dois paga ainda mais caro. Até R$ 300 por uma consulta particular (metade de um salário mínimo, não nos esqueçamos). E se tiver que internar, pode pensar em vender todos os bens. Um dia se internação pode passar dos dez mil reais.
Se isso já não fosse cataclísmico suficiente para pintar um panorama obscuro à frente, temos os partidos onde somos OBRIGADOS POR LEI a escolher nossos futuros governantes.
NENHUM PARTIDO POLÍTICO PRESTA
Me desculpe se você é um militante dessa ou daquela legenda, mas a verdade é que todos os partidos disponíveis para receber seu voto hoje estão muito aquém do que deveriam. Os candidatos são despreparados. Vivemos hoje um problema gravíssimo que é a falta do planejamento.
O político, seja ele PT, PSDB, DEM ou seja lá que outra merda de sigla você quiser, pensa da mesma maneira: “O meu governo”.
A visão do cara é construída com base num limite prefixado de tempo que durará seu mandato. “Depois é o depois”. Essa é a tônica geral, que não aparece nos discursos mas fica evidenciada pela prática. A sensação é que a falta de planejamento crônica estabeleceu como “natural”, ir fazendo as coisas de qualquer jeito, como dizem, à Bangu. O Brasil se tornou reativo. Muitas vezes, o que um governo fez o outro desconsidera e começa tudo do zero. E é assim que muito dinheiro nosso vai parar no ralo.
Ao fazer este post acabo de testemunhar na pele um exemplo do que é o problema infraestrutural. Vivo numa cidade grande, cheia de gente rica, onde – a grosso modo – a qualidade de vida é melhor que a grande maioria das demais cidades do país. Eu estava escrevendo e faltou luz. Não foi um blecaute. A luz caiu e voltou. Sintoma de sobrecarga. Tá calor, geral liga o ar, o povo que usa gato de luz compra o ar mais barato, que é o que consome mais energia, que ele, afundado em sua ignorância acha que é “de graça”. Por que a luz falta se eu pago, pago caro e pago em dia?
Subdimensionamento da rede. A companhia, culpará o pobre, que faz gato. Mas a verdade é que a conta lá do pobre do gato, eu paguei ao cobrir uma energia cara.
Então meu post vai ter que parar aqui, já que faltou luz duas vezes, e não pretendo ferrar meu computador. Peço perdão por apontar problemas e não mostrar caminhos, mas se eu tivesse esse caminho em vista eu estaria mais feliz. A gente vai ter que se conscientizar de que só vamos ter uma vida digna quando o Brasil tiver serviços públicos universais com qualidade mínima – isso vale para educação, saúde, transportes e segurança pública. Enquanto formos “a nação dos sem noção”, continuaremos agarrados na miséria, abraçados com o infortúnio e casados com a desgraça de papel passado.
O post Agenesia da noção foi criado no blog Mundo Gump.
Uma garota do tempo de uma emissora francesa teve que ficar nua na televisão para cumprir uma aposta feita anteriormente. Ela havia garantido que tiraria suas roupas caso a seleção de futebol do país conseguisse obter êxito e se classificasse para a Copa do Mundo de 2014, que ocorrerá no Brasil.
